
Quem és tu?
...
Não me respondes?
...
quem és tu?
Quem És Tu??
QUEM ÉS TU???
É como se entre mim e ela existisse apenas um eco infinito sem feedback possível...
Quem sou eu?
um espaço aberto a divagações...tuas, minhas...inspira-me e inspira-te comigo
Existe na terra do sempre um cantinho onde o sol nunca se põe, onde ele nunca nasce também… está sempre à espreita qual mistério existencial. Lá atrás das árvores esconde-se um mundo onde o sol brilha… onde quem está do lado de cá nunca poderá ir.
A Chuva vive do lado de cá. Já não se lembra quantos anos tem, nem mesmo quando nasceu, a idade foi algo que se perdeu com o tempo. Ela gosta de brincar em cima do lago, sempre que lhe apetece bate os seus pés em cima dele sem deixar que ele a apanhe… o seu passatempo preferido é mesmo provocá-lo para depois fugir para junto das árvores, apenas porque sabe que lá o lago não consegue chegar.
O Lago também vive do lado de cá, sabe que é velhinho, o resto nem se atreve a dizer. Passa os dias a olhar para o céu, um céu onde o sol não brilha mas onde também não é noite. Perde horas a pensar como seria se pudesse ver o sol ou a lua… horas que são interrompidas pelas criancices da Chuva que nem com a idade perde o seu jeito de menina.
As Árvores são as únicas que conhecem o lado de lá, mas não falam, por muito que a Chuva ou o Lago perguntem o que existe “lá” elas passam os dias a limpar as suas folhas, não fazem mais que isso…
A Chuva acha que do lado de lá está um sítio encantado… onde príncipes e princesas dançam ao som de violinos e são iluminados pelo sol. Sempre que dança em cima do lago imagina-se com um vestido de princesa, a rodopiar pela mão do seu príncipe…
O Lago acha que do lado de lá está a lua e o mar, perde horas a imaginar as conversas que ambos têm e gostaria de um dia poder fazer parte de uma delas… apenas de uma…
Do lado de lá está o sol e todo um outro mundo, do lado de cá a Chuva, o Lago, as Árvores, o sol que nunca nasce nem se põe (apenas existe) e acima de tudo os sonhos…
Corria o dia y do ano x, começou com chuva. Foi quase como se o dono da meteorologia adivinhasse o meu estado de espírito. Chorava por dentro, um choro que vinha bem lá do fundo, de lá dentro, daquele sítio que sabes bem qual é… aquele que ama, odeia, guarda memórias e sonha com as que virão, isso mesmo aquele sítio a que chamam coração. Ele acordou a chorar. Não, não lhe perguntei porquê, isso apenas faria com que acordasse aquele outro sítio onde habita a razão, isso mesmo o cérebro. Não quis saber qual a razão… mas eles comunicam… o cérebro é um sítio complicado que gosta de indagar acerca das coisas por isso assim que se apercebeu começou a questionar o que se passava com o seu amigo coração. Cedo se apercebeu que tudo se devia aquela maravilhosa palavra que só os portugueses proferem, saudade. Saudade? Mas saudade de quê? O pior é que o coração é aquele sítio indeciso… que apenas sente sem se perguntar seja sobre o que for… o diálogo é complicado como sabem…
O dia y passa lentamente, o canto da sua chuva embala as lágrimas do coração. Enquanto o cérebro insiste em não parar.
Final de tarde, a chuva pára, algures num momento ficou decidido que eu iria caminhar á beira-mar. Fui. Molhei os pés e sentei-me na areia fria da chuva e da água que a beija constantemente. As lágrimas voltaram, senti-as quentes enquanto deslizavam pelo rosto, coração e cérebro deram as mãos enquanto o pôr-do-sol começou a cair, senti algo que me invadiu, uma certeza repentina… Sorri… posso até chorar sem saber porquê, o meu coração e o meu cérebro podem inclusive levar a cabo batalhas infindas mas a verdade é que sou vida, recheada de momentos, momentos que me fazem feliz…
Abro os olhos a luz incomoda-me e por isso mesmo sou obrigada a fechá-los de novo. Sou alertada não por um som mas pela falta dele, procuro na cama o vestígio de uma presença, nada, está apenas gelada. Abro de novo os olhos lutando contra a luz, tento olhar em volta mas fico presa na sombra de uma estrela que dança na parede, fecho os olhos de novo porque não aguento mais. Um flash traz á memória um beijo violento, abro os olhos repentinamente, o que se passou? Não me lembro deste beijo e no entanto senti-o tão real… mais uma vez a sombra, oscilando esquerda direita como o tic tac de um relógio. Fecho os olhos e de novo uma visão, foram beijos, abraços, arranhões violentos que me rasgaram a razão. Dentes que ferravam carne fervilhante de prazer, lábios que se cerravam para não soltar os gemidos que se debatiam para sair, palavras que se dirigiam não ao ouvido mas aos poros que lhes reagiam estremecendo e contorcendo-se. Abri de novo os olhos, conseguia sentir… inalava aquele cheiro a prazer, pecado saboroso, sentia ainda nos meus lábios os daquela outra pessoa sem rosto, porque não me lembro? Ansiava por entender o que se passava. A luz continua a incomodar-me, mais uma vez os olhos fecham e aquela imagem surge, um olhar pousado em mim, tentava fugir-lhe mas ele insistia atracar em mim, soltava faíscas sempre que se cruzava com o meu, sinto ainda o desconforto de o ter sobre mim colado no meu corpo. Tento insistentemente que me abandone e por isso mesmo as minhas mãos pousam sobre os seus olhos, é agora a sua boca que me procura, fujo para que não me sinta. Atraca nos meus seios, ferra-os de tal forma que não consigo evitar o grito que se atropela subindo a espinha em direcção aos meus lábios, beijo-o para que sinta a ebulição que emana do meu corpo, afasta-me segurando a minha cabeça para que possa assim observar-me mais uma vez. O seu olhar é demasiado pesado para que o consiga suportar tento escapar mas estou de tal forma envolvida que raciocinar não é uma hipótese, estamos colados frente a frente, as minhas pernas entrelaçam-se na sua cintura e as minhas mãos perdem-se nas suas costas. Olha-me ainda, empurro o meu corpo para trás e encosto as minhas mãos nos seus joelhos para que não me alcance, mas ele não deixa, sinto o peso das suas mãos nos meus ombros puxando-me para ele, para aquele corpo sem rosto, não consigo vê-lo e por isso mesmo não suporto que veja a nudez da minha alma o desejo está tão eminente que não consigo parar de estremecer, sinto o seu arfar quente no meu pescoço e mordo os meus lábios para que não gritem de prazer, sinto o meu coração palpitar em sintonia com todo o meu corpo, quero agora olhá-lo mas estou tão longe que já nem sei comandar o meu cérebro. Respiro, limito-me a respirar já que tudo o resto me é agora alheio, solto um gemido furtivo e sinto-o sorrir, sei que sorri sem que precise olhá-lo, debruço-me sobro o seu peito e ferro os meus dentes nos seus ombros para que assim sinta tudo aquilo que já não consigo controlar, cravo as unhas nas costas daquele corpo sem rosto e sinto a sua língua nos meus seios desenhando círculos perdidos, seguro-lhe a cara e atraco na sua boca, mordo-lhe os lábios para que melhor me sinta estou quase a explodir, sinto as suas mãos percorrendo-me as costas com as pontas dos dedos estremeço e sinto agora que os meus olhos se querem abrir, ordenam a todo o meu corpo que execute essa ordem, sinto as pálpebras abrirem lentamente para que dêem espaço a que o prazer se revele também… abro os olhos e sinto ainda o sobressalto que consome o meu corpo mas não encontro nada apenas a mesma sombra daquela mesma estrela balançando, tic tac, tic tac…
São gostos. Sempre que a língua se remexe em contacto com o que lhe ofereço. “peach, i can eat a peach for hours” , i do can. Just not the same way mister Nicolas Cage does in that movie… peach, pêssego poderia ser, com a sua pele de veludo e o seu corpo rijo que apetece trincar… poderia mas não é. Poderia ser um morango, com a sua cor de sangue e os seus grãos, não de areia mas de sabor…trincá-los-ia de bom grado e sugaria o sumo que me escorregou pelas mãos. Poderia ter sido um limão, pô-lo-ia na boca para sentir o seu azedo reflectido nos meus olhos que se cerram. Poderia mas também não foi. Poderia ser manga… daquelas que já não se trincam, chupam-se até ao caroço e deixam saudade. Poderia mas também não é. Poderia ser maçã, aquela que se trinca após o almoço para amansar uma refeição pesada, mas também não é. Poderia ser uma nêspera ainda amarga por não estar suficientemente madura, mas parece-me pequena demais, não me apetece logo não o é. Poderia ser tanto… e é apenas uma ameixa… uma ameixa e o seu gosto a cereja na minha língua…
Madalena, mulher feita com olhar de criança, cabelos negros e desajeitados, boca de ameixa, sorriso de maçã, pele de farinha, mãos de harpa, voz de mel.
Carlos, homem quase por construir, olhar perdido, cabelos castanhos e ordenados, boca de morango, sorriso inexistente, pele de avelã, mãos de terra, voz de cigarros engolidos.
Madalena estuda, quer ser professora para ensinar os meninos. Gosta de cantar ás escondidas do pai para que este não a chame de tola. Lê incessantemente como se as palavras fossem o único alimento que necessita. Todas as manhãs passeia á beira do lago e chora sem saber porquê.
Carlos trabalha, já desde os 12 anos, não tem sonhos, aspira apenas encontrar alguém que cozinhe para ele e seja um abrigo quando chega do trabalho. Não sabe ler mas gosta de ver as fotografias que acompanham as letras do jornal que todos os dias folheia no café do Senhor João. Todas as noites vai dar um passeio á beira lago olhando a lua, chora sem saber porquê.
Hoje a manhã estava agitada e Madalena não pôde ir dar o seu passeio ao lago. Optou por refugiar o seu olhar num livro, um qualquer romance que a faz ter um brilho especial nos olhos. Canta enquanto cozinha o almoço.
A agitação do dia não deixou que Carlos pudesse trabalhar, foi para o café do Senhor João e passou o dia inteiro a olhar as imagens dos jornais perdidos entre as mesas e acompanhados por cigarros. Pela primeira vez quis saber o que eram aquelas letras e os seus olhos brilharam. Assobiou uma música qualquer e foi para casa. Não conseguiu ir ao lago, a noite estava demasiado agitada.
O sol dourava o chão e a água estanca do lago. Apenas uma sombra ocupava aquele ouro. Carlos chegou primeiro, sentou-se ao lado dessa sombra sem deixar que ela o pisasse, olhou a água. Madalena chegou e viu que alguém ocupava o lugar onde todas as manhãs se sentava. Aproximou-se e disse Boa tarde, nervosamente Carlos respondeu da mesma forma. Madalena sentou-se ao seu lado. Abriu o livro que havia levado consigo e começou a ler
Andam por aí palavras soltas no vento. Batem nos campos e curvam as ervas que apenas querem existir. Andam por aí, a espalhar confusões, a curvar opiniões e desejos.
Andam por aí palavras soltas no tempo, bateram ontem na minha face e estalam hoje no meu ouvido… sopro surdo que ensurdece de tão gritante que está. Andam por aí ambiguamente. Diz mais baixo, não grites tanto por favor, gosto dos sussurros, são mais fáceis de ouvir.
Andam por aí palavras soltas que me desfazem os caracóis, querem irritar-me mas eu não ouço o que dizem, sorrio apenas porque não entendem.
Andam por aí palavras soltas no vento que curvam as árvores e não as raízes. Fazem-nas dançar mas não recuar.
Andam por aí palavras soltas no vento, batem, cantam, dançam, desordenam, são, passam e seguem enquanto eu permaneço com o silêncio do seu som.
A música soa de fundo, faz gingar a anca. Danço descalça no chão sujo que me escurece os pés e me faz deixar marcas quando passo para o chão limpo, deixo-me rodar ao sabor do som, rodopio, rodopio, rodopio. Abraço o vento, a única companhia que hoje permito… rodo e abraço o mundo que já tocou este vento. Os pés marcam a dança que se perde. De olhos fechados sigo o som da ginga inocente. Vida leve e feliz a destes pés que dançam. Dançam e esquecem as pegadas que antes marcaram, apenas esta dança importa. Não há vida além disto, danço e sou livre, sem memória e ri-o, como ri-o. Momentos de felicidade que nos invadem, para quê pensar no resto, estou feliz agora, não quero importar-me com o facto de que ela eventualmente irá acabar, quero apenas dançar. A anca continua a dançar, a música que se perde no espaço embala o sorriso e as lágrimas que caem da felicidade que tal simplicidade permite. Ninguém me conhece além do vento, das lágrimas e desta música que me faz gingar, sinto o cabelo acariciar-me a pele. Como sabe bem ser refúgio de mim mesma nesta ginga sem fim, apenas eu e o cenário onde danço. A saia roda ao sabor da ginga, abro os braços ao vento e danço. Estes pés descalços e sujos que marcam um momento. Não quero que acabe, quero dançar assim para sempre, neste momento… rodopio com a saia e o cabelo que me acompanham… mas a música chega ao fim e a anca pára com ela. O vento continua a soprar o cabelo e a saia, como que a incentivar-me a não parar, mas sem música os olhos abrem e o sorriso afrouxa, a lágrima cai. Olho o chão sujo dos pés que aqui dançaram, o sorriso volta, posso não voltar a dançar hoje, mas a música e esta dança poderei sempre repetir… um dia… num outro cenário…