quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

assenza

Entra.

Convido-te a entrar.

Senta-te na poltrona e ameaça-me a calma. Enche o copo com suspiros e esvazia-me os bateres do peito.

Pouso os lábios no copo de vinho. Vermelho como o sangue. Encorpado e com travo a... madeiras? Ou frutos silvestres?
Beijo o copo como se fossem os teus lábios. Quentes.

Sofre uma voz que escolhi como banda sonora.

O resto dispersa-se por entre espaços de silêncio pelo corredor.

O chão em madeira rectangular arrefece por entre o tempo que não é tocado.

Eriças-me a pele. Como gelo que toca em pedra quente.
Digo-o no espaço de um lábio que se morde. Mas não precisaria, porque o sabes.

Sinto o teu cheiro que se evapora por entre o respirar do teu peito. O teu e apenas o teu.
Não se confunde, mas divaga.

[I want you]

Passeio os dedos pelo meu pescoço simulando o que faria no teu corpo, se te tocasse, mas não estás...

Escorrem as últimas gotas pelo copo e deixo que me escorram pela boca como o desejo.

Quero o teu cheiro na minha pele.
O teu calor espalhado pelo meu corpo.
O teu sabor impregnado na minha boca.
TU.

Se te disser que te beijo em pestanejares, compreendes?
Se te disser que te falo em sorrisos, entendes?
Se não te disser, ouves?

"Sei que tudo é definitivo e nada é eterno." Disse ele.

Eterno o sabor
Eterno o sentir
Eterno o saber

Definitivo o indefinido
Definitivo o sentido
Definitivo o momento

Nada de nós em nós é eterno, definitivamente.


imagem retirada do Google

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

leeg


Bate no peito secura
azul
esverdeada

Desdobram-se as mãos por entre pequenos espaços livres no vazio

uma porta que se abre no fundo de um corredor escuro

uma voz que chama, semi viva...

Não há passos.
Inércia.

Ela seguia.
casaco preto.
ténis gastos na sola.
atacadores a arrastarem pelo chão.
gorro que esconde um cabelo longo e negro, liso.
um lenço semi enrolado envolvendo o pescoço.

Ia...

a noite desenhara-se já em espaços negros pela rua
as sombras antes escondidas do sol, estendem-se agora sob fracas luzes ao longo da rua.

Algumas músicas saltitavam nos seus ouvidos.

Não estava triste mas sentia no seu peito uma tristeza recorrente...
Aquela que não se acoita num peito
Que não morre num sorriso
Que não é roubada por ninguém.

Aquela que a conhece desde sempre
que se esconde no canto da íris
no bater fraquejado do coração
no sinal que se adormeceu no seu rosto

Segue branca rumo ao escuro
sozinha
apenas com vozes nos ouvidos.

Vazia.
Não está vazia, mas vai sendo vazia em breves espaços que lhe arrepiam a pele ao tocar a brisa.

Olha um vago vazio sem dono que se estende pelo caminho.

Tocam sinos.
Passam carros.
Fortes luzes intermitentes.

Esqueceu o relógio.
matou o tempo em breves minutos.

Não há vontade neste espaço.
Mas segue.
Há um destino... ao qual escapa hoje... porque sim.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Do Vir


Sorrimos num espaço perdido
de mãos dadas no vazio
Soltamos palavras que não ouvimos porque o vento roubou...
ou talvez as tenhamos apenas esquecido

Será assim o tempo do nada
do amargo
do compulsivo

Prendo-me no teu pescoço
é o teu cheiro que me guia...

Engulo soluços, sorrisos, restos de mim
e vomito palavras que não respiram
que não voam
que se guardam por entre espaços vagos

Há caminhos

Há destinos


Há nadas.

Dou passos por entre quadrados sujos e gastos
e vejo pequenos desenhos que rastejam apagados
deixamos uma história para trás, sempre que seguimos em frente
e não consigo não ver a criança que corre atrás de quem dela se esquece...

Tornamo-nos algo
transformamos muito
guardamos nadas no espaço de uma vírgula

Suspiro.
Não há um fim.
Há um grito que se prende por entre o espaço que deixas vazio,abandonado.

[barulho]

repete comigo esse som tão estranho

[barulho]

estranho sempre as palavras repetidas, soam a nada

[barulho]

embrulho os braços no tronco inerte e gelado que esqueço em voos distantes...

[barulho]

sentes o eco que se estende no silêncio de um espaço que não é?

[barulho]

esqueci-me do que te ia dizer
talvez não fosse nada
talvez não tenha voz
talvez nem exista

[barulho]

deixo as velas arderem até ao fim
ou sopro para que se esqueçam prematuramente?

[barulho]

tinha uma capa azul... mas não o li

[barulho]

às vezes esqueço-me que não andamos, dançamos

[barulho]

às vezes deixo-te para trás

[barulho]

às vezes esqueço-me de seguir-te

[barulho]

afinal não é a elas que estranho... é a mim.

imagem, quadro de Maria Helena Vieira da Silva