segunda-feira, 4 de março de 2013

Meio





A árvore era verde. O baloiço era feito de papoilas. Vesti o vestido azul, porque é da cor dos sonhos. Baloicei ao ritmo dos pensamentos.  Aqueles que saltam do lado esquerdo para o direito sem que se centrem, sem que deixem que os centremos. Na verdade a culpa é nossa… não os queremos centrar, concretizar. Deixamos que saltitem de lado para lado, como crianças que não têm que pensar no que ficou para trás, no que virá. Aqueles pensamentos que não queremos ter, as lembranças que queremos apagar, as palavras que não queremos ouvir, as verdades que não queremos dizer.
[Suspiro]

Anatomia do esquecimento. Esqueço o que não quero, lembro o que não me apetece.
Esqueceste-me? Esqueces-me? Esqueci?
Balouço para trás e para a frente, ao compasso das memórias que vão dançando no movimento. Inclino-me e deixo que o corpo quase roce o chão… abranda o ritmo. De olhos fechados lembro o cheiro a laranjas, as laranjas que caiam quando baloiçava na árvore do quintal. Já não existe e a memória está tão longe… talvez à distância de 7300 dias, 175200 horas… tempo, ainda que não seja a sua real medida aquela que escolhemos dar-lhe. O relógio marca sempre o mesmo compasso, matematicamente desliza os números em sequência, 24h por dia. Assim sendo porque nos custam algumas horas a passar mais que outras?
[Suspiro]

Voa-me o tempo por entre o balouçar lento e o meu cabelo entrançado que raspa o chão.
Vejo a Alice sentada no galho e o gato que ronca ao seu lado… o tempo em que chegaram não existiu.

Alice: Meio cheio ou Meio vazio?
Eu: Não acaba por ser a mesma coisa?
Alice: Nop. Diz a teoria de que meio cheio é optimista e meio vazio o pessimista.
Eu: Não concordo.
Alice: Como não?
Eu: Pode estar meio cheio de nada e meio vazio de tudo.
Alice: Isso não faz sentido.
Eu: Nunca disse que fazia, são apenas perspectivas, como o optimismo e o pessimismo. Sempre fui mais pessimista que optimista.
Alice: Porque?
Eu: Parece-me mais real ser pessimista.
Alice: Porquê?
Eu: Dói menos esperar pouco. Porque na verdade esperas, tens uma expectativa, mas se a contorceres a ponto de fazeres com que o que esperas sejas mais seguro não te dói tanto quando não acontece.
Alice: Mas e se acontecer?
Eu: Se acontecer ficas duplamente feliz por que supera as tuas expectativas.
Alice: Já me tinha esquecido de como és depressiva.
Eu: Realista.
Alice: A realidade tem coisas boas.
Eu: Não disse o contrário, mas a realidade nunca consegue atender ao que esperas.
Alice: Talvez esperes demais.
Eu: Talvez…
Alice: Quem esperas?
Eu: Quem já chegou.
Alice: Meio cheio?
Eu: Meio suspenso nos nadas que me enchem, meio vazio nos tudos que me vão faltando.
Alice: Meio com Meio faz um cheio.
Eu: Talvez…