terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Equação


Pesa.


Pesam os dias, as horas, os minutos, os segundos, até mesmo as milésimas.


Pesa a natureza, árvores, flores, mar, rio, ribeira, riacho...


Pesa o dia, a noite,o amargo, o doce, vontades, decisões...


Questões pesadas à discrição.


Diria que o mundo é obcecado com o peso errado... quanto pesa o mundo?


Quanto pesa uma palavra, um sentimento, uma acção no teu mundo?


Quanto pesa um sonho ou mesmo um sorriso?



Quanto pesam as minhas letras? Demasiado eu diria... nada, dirás tu eventualmente


Pesamos o mundo de forma diferente.


Como podemos ouvir uma voz que não tem som?

Como podemos calar uma verdade não verbalizada?


Esquece...

Esquecer parece difícil, mas é mais fácil que a aparência eventual...


Lembramos com cheiros... somos animais afinal...

Proust lembrava o cheiro de um chá e consequentemente a madalena que o acompanhava... o cheiro despoleta a recordação...


Os corpos têm inerente um cheiro inconfundível, que permanece cravado na memória... o tempo, o mundo e o seu peso inerente podem apagá-lo, sem presença do corpo não há cheiro... sem cheiro... eventualmente tudo o que não é importante se esquece...


[SabiasQueHojeMorri?]


Em doçura que me escorregou pelos dedos para ser desperdício no chão, sem mão que a acolhesse...


[Sorriso]


Não dói a doçura sem corpo onde acoitar-se, engraçado mas de facto não dói...

Dói bem mais a saudade de ser o chão frio de pedra inerte.


Se ao menos o mundo não pesasse tanto... talvez o som fosse audível...


Silêncio permanece então.


[QuantoPesaARessureição?]

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Janela


janela aberta ao fundo do quarto.


corredor de memórias indecifráveis.


equívocos, mistérios, susurros.


chuva como banda sonora e vento a moderar a temperatura ambiente.


Lembra a menina na rua que indiferente à chuva escolhe percorrer o caminho ziguezagueado e azul escuro da calçada do passeio, enquanto os pais zangados chamam por ela mais à frente,


Lembra que outrora fora ela a menina que fugia de casa para dançar à chuva...


Escuridão rasgada por linhas de luz.


frio


frio


nada mais que frio.


sem som, sem cheiro, alheia ao que a rodeia.


Voam, da vida fora da janela, sons


[que ela não ouve]


invadem o quarto e preenchem-no


ela permanece


vazia.


há quem a olhe,

há quem a beije,

há quem lhe fale,

há quem lhe dê,

há quem lhe tire,

há quem a ame,

há quem lhe tenha ódio,

há quem a magoe,

há quem a escute,

há quem a cale,

há quem com ela cruze...


Vê-la-ão por entre tanto que a rodeia?


[ela não vê]


Aninhada no canto direito oposto à janela respira notas de vida que se escapam por entre o vento, de olhos fechados imagina como será o azul, como será o sorriso de quem voa por entre braços de conforto, de quem não rasga sons e segue sem olhar para trás...


[ela não é]